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Alan Mortean

Museu de la Memoria, no Chile

Atualizado: 8 de abr. de 2020


- Conhecendo o Chile -

“Aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la” – Edmund Burke, filósofo e político anglo-irlandês do século XVIII.

Em Santiago, capital do Chile, está instalado um museu chamado ‘Museu de la Memoria’, dedicado ao período em que o país passou por uma ditadura militar, de 1973 a 1990.

Em uma oportunidade que tivemos de visitar a cidade, fomos ao museu. A exposição é bem-feita, há bastante material, que está apresentado de diversas formas: há cópias de documentos oficiais, inclusive da CIA (agência de inteligência, ou espionagem, dos Estados Unidos), reportagens de jornais da época, narrações de rádio e imagens de televisão gravadas no momento do golpe, do lado de fora do palácio do governo, muitas fotos, e entrevistas atuais com pessoas que viveram durante a ditadura e que contam suas experiências.

Permanecemos várias horas no museu; minha experiência foi impactante, senti tristeza ao ver as imagens e ouvir os pronunciamentos, narrações e sons do dia do golpe militar, 11 de setembro de 1973. Senti compaixão por Salvador Allende (o presidente no momento do golpe), por sua equipe e pelos chilenos que vivenciaram esse dia. Envolvido por esse clima, de repente senti meus olhos se marejarem e duas lágrimas correram pelo meu rosto (eu não me lembro qual havia sido a última vez que havia chorado).

No momento do golpe, Allende contava com 3 anos de governo, e enfrentava um momento político instável, com a Unidade Popular (coalizão de partidos do governo) ganhando representantes no parlamento, mas sofrendo ataques do Senado e do Poder Judiciário.

Uma oportunidade interessante que o museu nos dá é escutar o último pronunciamento de Allende, que é feito via rádio, de dentro do palácio de governo no momento do golpe, e também o primeiro pronunciamento da junta militar presidida por Pinochet. É arrepiante escutar a claridade e firmeza de Allende, e muito interessante escutar as palavras de Pinochet, e depois contrastá-las com o que foi o governo militar, totalitário, violento e violador dos direitos humanos.

No dia do golpe militar houve festa e alegria de um lado, com pessoas comemorando em suas casas; e do outro lado houve medo, violência e tristeza. Em um dos testemunhos disponíveis, uma pessoa relatava que no dia do golpe, policiais entraram na sala de aula onde ela estudava e espancaram o professor na frente dos alunos.

Com pesar sabemos que o golpe militar chileno não foi um golpe isolado, mas foi MAIS um na América do Sul (o golpe no Brasil já havia ocorrido há 9 anos). Nesse período obscuro, os governos do Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile e Bolívia se organizaram e criaram a Operação Condor, que era uma ação conjunta destes para sufocar o comunismo. A Operação estava sendo tão “exitosa” que chamou a atenção dos Estados Unidos, que achava que esses seis países estavam ficando demasiado unidos, e era necessário, a cada oportunidade e a cada encontro diplomático, ressaltar suas diferenças. Parece teoria da conspiração, mas é verdade, e no Museu há documentos da CIA, secretos na época, que mostram isso. Resumindo, os EUA apoiaram vários golpes militares na América do Sul (com o pretexto de combater o comunismo), mas não tinham interesse na união desses governos, que poderiam formar um bloco forte... A questão é a mesma de sempre: poder.

Um governo totalitário, que não respeita direitos humanos, não se mantém no poder SOZINHO por tanto tempo; para sua perpetração, o apoio da mídia é essencial; é necessária propaganda e publicidade falando bem do governo, e ignorando o que é negativo. O Chile não é uma exceção à essa regra: governo e mídia atuaram juntos para distorcer informações e ocultar assassinatos perpetrados pelos militares, e o principal aliado do governo neste sentido foi o jornal El Mercurio, o primeiro jornal em espanhol da América e atualmente o maior do Chile. No museu há uma parte dedicada à mídia.

Conhecendo a história contada no ‘Museu de la Memoria’ e a relação que tinha o governo e a mídia, me vejo obrigado a traçar um paralelo com a história do Brasil. Sabemos que a Rede Globo cresceu muito durante o regime militar (informações sobre isso podem ser vistas neste link ), como se deu isso?

Assim como no período da Ditadura Militar do Brasil (1964 a 1988), no Chile os Partidos Comunistas foram considerados ilegais, houve repressão, violência, pessoas desaparecidas e mortes, muitas mortes: os números oficiais para o Chile são de 40.280 mortos ou desaparecidos nesse período. Inclusive, dentro da Operação Condor, militares brasileiros eram enviados ao Chile para ensinar-lhes técnicas de tortura... Sim, o Brasil exportava métodos de tortura aos países vizinhos durante o regime militar; que orgulho para nossa nação, não?

Todo esse material foi reunido a partir do trabalho da Comissão da Verdade do Chile, que atuou durante nove meses, de 1990 a 1991. Uma comissão formada por destacados juristas, historiadores e cientistas políticos chilenos, que teve como objetivo buscar informações sobre o período da ditadura militar no país.

No mundo, mais de 35 países já instalaram Comissões da Verdade para esclarecer períodos obscuros de suas histórias. Na América do Sul, Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia, Peru e Colômbia instalaram suas Comissões da Verdade antes do Brasil, que teve sua comissão de 2012 a 2014 (Mais informações no site http://www.cnv.gov.br/).

No final da exposição, no último andar do Museu, havia uma mostra de fotos atuais de militares que atuaram no regime militar em alguns países da América do Sul. Me chamou muito a atenção as fotos dos militares argentinos sendo julgados em tribunais; não era possível ver seus rostos, pois eles estavam sempre escondendo a cara; mas mais atenção ainda me chamou a única foto que havia do Brasil: um ex-comandante do exército brasileiro posando para a foto ao lado de uma lagoa, em Brasília. Essas duas imagens falam mais do que todo este texto.

O que você sabe sobre a ditadura militar no Brasil?

* Augusto José Ramón Pinochet Ugarte, o ditador chileno, morreu no dia 10 de dezembro, o Dia Internacional dos Direitos Humanos.

Mais informações sobre o papel da TV Globo na ditadura militar brasileira, no documentário Muito Alem do Cidadao Kane: https://www.youtube.com/watch?v=049U7TjOjSA

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