Dai a César o que é de César
- Os Antípodas
- 23 de ago. de 2015
- 4 min de leitura
Atualizado: 15 de abr. de 2020
Diário de bordo 10 - Projeto Ciclos
De Colônia del Sacramento, no Uruguai, fomos para Buenos Aires, a capital argentina; avançamos nosso cronograma em mais uma semana, e acabamos chegando em Buenos Aires um mês antes do planejado.
Nosso transporte foi um barco, que pegamos no confortável porto da cidade uruguaia e cruzamos o Rio de la Plata em aproximadamente uma hora. Pagamos cerca de R$100,00 cada um, sem ter que desmontar ou pagar a mais pelas bicicletas.
Na aduana, já em solo argentino, passamos todas as bolsas e alforjes pelo raio-x; o cachorro farejador ficou cheirando a capa de chuva da minha mochila e o agente da polícia me pediu para abri-la para ele olhar. Como não havia nada, nos liberou e entramos no país pela segunda vez em nossa viagem.

Foto 1: Catedral onde se encontra enterrado San Martin.
O próximo passo seria buscar um lugar para dormirmos, já que a noite se aproximava. Sem um GPS ou mapa, fomos perguntando; perguntamos para várias pessoas em vários lugares, paramos, conversamos, fomos, erramos, voltamos, até que chegamos à Casa Rosada, no centro da cidade, a sede do poder executivo argentino, onde vimos a imensa bandeira nacional tremulando a uns trinta metros de altura, imponente, na noite portenha. Ali pensamos: retornamos à Argentina!!!

Foto 2: Alan e Mafalda, um caso de amor.
Rodando um pouco mais, encontramos um hostel simples para descansarmos, onde acabamos permanecendo por uma semana, pois não conseguimos nenhum contato de última hora que nos hospedasse, e estávamos esperando passar a cólica pré-menstrual da Marcela.

Foto 3: Centro histórico de Buenos Aires.
Na cidade, passamos mais tempo escrevendo, atualizando o site e buscando equipamentos do que fazendo turismo; assim, deixamos de conhecer vários atrativos da capital que poderiam ser interessantes, mas uma das oportunidades que tivemos, gostamos muito; foi uma visita guiada caminhando pelo centro da cidade, gratuita, dentro do conceito de “free tours”, que são tours baseados em gorjeta; os participantes contribuem se quiserem e com a quantia que quiserem. Nossa guia nos ofereceu uma visão crítica da história argentina, inclusive entrando num pequeno embate com um senhor argentino que passava por ali enquanto ela falava com o grupo, por ela ter dito que um grande líder histórico argentino chamado Júlio Argentino Roca tinha sido na verdade um genocida se olhássemos seus feitos com outros olhos.

Foto 4 : Nota de 100 pesos, que aparece o Julio Argentino Roca.
Na cidade também passei por uma experiência inédita: caminhava pelo centro, na conhecida rua Florida (uma rua apenas para pedestres), buscando uma loja para consertar nosso celular enquanto a Marcela ficava no hostel por causa da cólica, quando fui abordado por uma senhora que estava divulgando um bar e cafeteria, um lugar para ir à noite. Fui com ela no lugar, a cem metros de onde estávamos, para que ela me desse um papel que daria direito a um desconto para eu voltar lá depois com a Marcela.
Quando entramos, a senhora foi até os fundos e três trabalhadoras dali vieram falar comigo... Aí eu percebi que o lugar não era um bar e cafeteria, mas uma casa de prostituição, e lhes disse que iria embora. Ao ouvir isso, as três disseram que, só por eu ter entrado, teria que pagar o valor mínimo, que era de 300 pesos... 100 reais! Eu ignorei e me voltei pra porta, pra sair, e as três se colocaram entre a porta e eu, agressivas. Era só o que me faltava!! Me acalmei, sentei e expliquei pra elas o que a senhora tinha me falado, e também contei da viagem de bicicleta... mas era um golpe, elas não estavam interessadas em histórias, apenas na grana. A situação tensa durou de 10 a 15 minutos. No final eu peguei 300 pesos, dei a elas e fui embora.
Saí caminhando novamente pelo centro, triste, ainda tentando digerir o que tinha acontecido. Não procurei a polícia, mas depois fiquei sabendo que havia uma defensoria do turista; lhes contatei, escrevi todo o ocorrido e eles irão fazer uma denúncia contra o “bar e cafeteria”, o que pode ocasionar, se der certo, uma multa ou um fechamento do lugar. Algo a se ressaltar é que a própria defensoria disse que fiz bem de não contatar a polícia, pois certamente a polícia da área sabe o que se passa ali e é conivente com a situação. Não acredito que o lugar será fechado, mas seria ótimo se outras pessoas não fossem enganadas como eu.

Foto 5 : Calle Maipú com Perón, microcentro de Buenos Aires.
Nesse mesmo dia acabamos saindo à noite, mas não no “bar e cafeteria”, hehehe; jogamos sinuca, tomamos vinho e comemos pizza; e ainda tivemos tempo para correr pela rua Florida para voltar a um barzinho onde eu havia esquecido minha capa de chuva.
Cidade grande é sempre uma loucura. Há muita gente e as pessoas tendem a ser mais desconfiadas e menos solidárias, por medo. Além disso, elas são lugares perfeitos para se gastar dinheiro. Tudo tem um preço, e pudemos sentir isso na prática em nossa estadia de sete dias em Buenos Aires. Pra mim foi duro gastar tanto num único lugar, depois de três meses e meio de gastos controlados... mas também foi uma constatação pessoal, a frase “Dai a César o que é de César” aplicada na prática.

Foto 6: Pedalando no centro de Buenos Aires.
Assim, resolvemos nos afastar do grande centro o mais rápido possível. Já que chegamos à cidade num meio de transporte inédito no Projeto Ciclos, o barco, seguimos a tendência e saímos também num transporte inédito: um trem. Tomamos o trem numa estação localizada num prédio histórico com um pé direito muito alto, lindo, a estação Constitución. Viajamos toda a noite, por 14 horas, quase sem dormir pois fomos na classe mais barata (que não era muito confortável, hehehe), num percurso de 600Km rumo sul, e chegamos à cidade de Bahía Blanca, onde tínhamos um contato da rede de hospedagem voluntária Couchsurf.
Informação do percurso

Foto 7: Mapa do percurso
Dia 134 ao 141 - 04/08/2015 a 11/08/2015
Buenos Aires, Argentina
Gastos até agora: R$5676,00
Gastos por dia: R$40,26
Distância pedalada até agora: 1952km
Distância percorrida de carona, de ônibus, de barco e de trem até agora: 1319km
Furos de pneu até agora: 7
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